"Snow, snow!"
Anunciava a vizinhança batento na porta de casa. Era a primeira neve do inverno colorindo de branco os galhos pelados das árvores. Era a primeira neve na vida das meninas brasileiras cobertas de agasalhos e gargalhadas.
Tudo parou: as escolas suspenderam aulas e todos foram dispensados do trabalho. Com bóias gigantes para escorregar na neve e roupas de astronauta nos juntamos ao grupo que nos esperava lá fora .
As crianças deitaram no chão, a neve caindo no rosto enquanto abriam e fechavam as pernas ao mesmo tempo em que subiam os braços até o alto da cabeça e voltavam com eles rente ao chão. Uma fileira de crianças fazendo o mesmo. Os braços subiam e desciam, pernas abriam e fechavam. Riam. Subiam e desciam, abriam e fechavam. Que raios era aquilo? Uma menina ruiva com uma bola de neve na boca me explicou.
"We are playing snow angel. "
"We are playing snow angel. "
A menina saiu do chão e mostrou o desenho de anjo que ficou marcado na neve com seus movimentos.
Mas depois de brincar de anjo vem a hora de encarar o inferno.
Já de noite, temperatura abaixo de zero, pijamas embaixo dos casacões, começa o barulhinho das pás limpando à frente das casas. Alguém cai a cada 5 minutos-o pior é quando o alguém é sempre você. Jogar sal no chão para evitar os...tombos, eheh, tarde demais. Acordar cedo, tirar as crianças da cama e só depois descobrir que as aulas começarão mais tarde, só depois de tirarem a neve da escola. Limpar o vidro do carro antes de ir para o trabalho. Virar a direção do automóvel para a esquerda e o infeliz simplesmente ignorar seu comando e ir para onde lhe der na telha.
Até que a neve branquinha fica preta. O caminhão empurrando o que sobrou passa e amontoa tudo. O sol passa e derrete tudo.
Derrete até a memória do inferno. E na próxima neve, sai todo mundo correndo brincar de anjo.